Disrupção: Tudo com Raphael Rocha Lopes
“♫ Come gather ‘round, people/ Wherever you roam/ And admit that the waters around you have grown/ And accept it that soon you’ll be drenched to the boné/ If your time to you is worth saving/ Then you better start swimmin’ or you’ll sink like a stone/ For the times, they are a-changin'” (The times, they are a-changin’; Bob Dylan).
Imagine um cenário onde os carros nas ruas do Brasil respeitam todas as regras de trânsito: param nas faixas de pedestres, respeitam os limites de velocidade e jamais estacionam em vagas para idosos ou deficientes. Parece utópico, mas está mais próximo com a chegada dos carros autônomos, que são programados para seguir as normas à risca, sem exceções. Diferente dos motoristas humanos, eles não “esquecem” de dar seta e nunca utilizam o pisca-alerta como salvo-conduto para parar em qualquer lugar proibido ou limitado, como se os veículos se transformassem magicamente em peças invisíveis ou imunes às leis. Também não estacionam em fila dupla na frente das escolas (que demonstra o tipo de educação que os pais dão aos filhos) ou em ciclofaixas.
Atualmente, a realidade é outra. Motoristas desrespeitosos que tratam as regras como sugestões, e não observam sequer as regras de bom senso estão por todos os lugares, sem qualquer constrangimento. Quando multados, muitos se revoltam, mesmo sabendo que estão errados. Esse comportamento no trânsito reflete um problema mais amplo da nossa sociedade: a falta de respeito ao outro e a ideia de direitos ilimitados para si, enquanto os outros devem apenas aceitar e obedecer.
Esse comportamento revela uma questão maior, que vai além do simples ato de dirigir. O trânsito, como um microcosmo da sociedade, reflete a forma como muitas pessoas encaram as normas e a convivência social. É comum encontrar motoristas que acham que as regras foram feitas para os outros, enquanto eles estão acima de qualquer regulamentação. Esse desrespeito vai desde ultrapassagens perigosas até estacionar em locais que prejudicam o fluxo de outros motoristas, ciclistas e pedestres. É uma postura que expressa cabalmente a falta de educação ou a renovação da Lei de Gérson.
Carros inteligentes, mas não espertalhões
Nos carros autônomos não há espaço para a esperteza. Eles respeitam as regras e não usam as ruas para se impor como machos-alfa. Não há a ânsia de mostrar quem manda, mas, sim, uma condução eficiente e segura (em regra, ou, pelo menos, mais eficiente e segura do que a dos humanos). Esses robôs ensinam, por incrível que pareça, que o respeito às normas de convivência não é apenas questão de legalidade, mas de civilidade.
A chegada dos veículos autônomos promete mais segurança e fluidez no trânsito. Eles podem ser um exemplo de como o ser humano deveria se comportar: sem ego, sem impulsos que prejudicam os outros. Ironia ou não, talvez seja preciso que máquinas nos mostrem o caminho da humanidade para os humanos. Em vez de competir, esses veículos fazem lembram que respeito é a base para uma sociedade mais justa.
O Brasil só irá avançar de verdade quando o brasileiro aprender a ser mais responsável, empático e respeitoso. O paradoxo é ter que aprender com máquinas. Quem sabe, ao seguir o exemplo dos carros autônomos, compreendendo que o respeito às normas e ao próximo não é uma limitação, mas sim um caminho para um convívio mais harmônico e seguro, o brasileiro melhore como ser humano.
O futuro do trânsito pode ser autônomo, mas o aprendizado que essas máquinas oferecem é mais profundo do que pode parecer.
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