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Alexandre de Moraes, de carrasco a meme

Opinião, informação e política com Milena Tomelin

Qual o verdadeiro motivo?


O Ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, é notoriamente conhecido por sua personalidade marcante, comportamento impositivo, impaciente e, por vezes, intolerante durante sessões de julgamento. Soma-se a isso um histórico de decisões polêmicas — algumas até questionadas pela comunidade jurídica. Recentemente, vídeos de trechos de depoimentos prestados no inquérito dos atos ocorridos em 8 de janeiro de 2023 viralizaram na internet, reforçando esse perfil. Um exemplo emblemático foi a ameaça de prisão ao ex-ministro Aldo Rebelo, feita pelo próprio Moraes por conta de uma resposta dada durante seu depoimento como testemunha, em 3 de junho, que aparentemente o desagradou.


Ao longo da semana passada, foi encerrada a fase de interrogatórios do chamado “núcleo crucial” da investigação dos atos de 8 de janeiro. Oito figuras centrais foram ouvidas entre os dias 9 e 10 de junho no STF: Mauro Cid (ex-ajudante de ordens), Alexandre Ramagem (ex-diretor da ABIN), Almir Garnier (ex-comandante da Marinha), Anderson Torres (ex-ministro da Justiça), Augusto Heleno (ex-GSI), Jair Bolsonaro (ex-presidente da República), Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa) e Walter Braga Netto (general da reserva e ex-ministro).


Os interrogatórios foram transmitidos ao vivo pela TV Justiça e amplamente repercutidos pela imprensa. Mas o que realmente surpreendeu — e, por que não dizer, divertiu — os telespectadores foi a surpreendente mudança de postura de Alexandre de Moraes durante os depoimentos. De carrasco austero, o ministro reapareceu em cena com um novo figurino: o Alexandre “paz, amor e piadas”.


A transformação foi tão gritante que viralizou nas redes sociais. Surgiram memes, montagens e vídeos humorísticos retratando um Moraes sereno, simpático e até espirituoso — algo até então considerado um fenômeno sobrenatural nos corredores do Supremo.

Durante o depoimento de Mauro Cid, por exemplo, ao ser citado como o único nome mantido numa suposta minuta de prisão, Moraes rebateu, com um sorrisinho sarcástico, que já haviam lhe concedido um habeas corpus. Em outro trecho, questiona o delator sobre conversas de bastidores entre militares, incentivando-o: “Pode falar a verdade, eu já estou acostumado”.


O humor se repetiu com o advogado Matheus Milanez, defensor do general Augusto Heleno. Ao solicitar que a audiência do dia seguinte começasse às 10h, o ministro “deferiu” parcialmente: “Marcada para as 9:02h. O senhor ainda tem quarta-feira para tomar um belo brunch.” No dia seguinte, brincou novamente com o advogado, dizendo: “Horário de almoço ainda está longe”, como quem diz: não reclame, ao menos está sol.

Até Jair Bolsonaro, seu desafeto político mais direto, foi recebido com certo fair play. Quando o ex-presidente perguntou se poderia contar uma piada, Moraes, com ar de camaradagem, sugeriu que consultasse seu advogado. Bolsonaro então o convidou para ser seu vice em 2026. A resposta? Um sonoro “eu declino novamente”, arrancando gargalhadas da audiência.


E claro, não poderia faltar o toque final de ironia: ao início do depoimento de Braga Netto — atualmente preso — o general, ao ser questionado se já fora preso, respondeu sorrindo que "estava na cadeia". Alexandre, com a precisão de um roteirista de stand-up jurídico, devolveu: “Eu sei, eu que decretei”.

Mas afinal, o que há por trás dessa mudança tão radical no comportamento do ministro? Será que finalmente encontraram o soro do bom humor no cafezinho do Supremo? Ou haveria razões mais estratégicas para esse súbito bom-mocismo institucional?


Três hipóteses se destacam:

1. Transmissão ao vivo para milhões de brasileiros.

Com os olhos do país (e do mundo) voltados ao STF, seria ingenuidade acreditar que o Ministro não estivesse calculando cada gesto. A nova postura foi um espetáculo à parte, talvez ensaiado para suavizar sua imagem pública, que amarga altos índices de rejeição. Afinal, ninguém quer ser lembrado apenas como o “carrasco do 8 de janeiro”.


2. Prevenção contra nulidades processuais.

Dessa vez, o script foi seguido à risca. Com uma conduta milimetricamente moderada, permitiu que todos os réus e advogados falassem à vontade — ainda que fossem prolixos. O objetivo? Evitar alegações de cerceamento de defesa ou suspeitas de parcialidade. Afinal, um sorriso ao vivo vale mais que mil embargos de declaração.


3. Pressão diplomática internacional.

Não se pode ignorar o timing: o secretário de Estado norte-americano Marco Rubio declarou, em 28 de maio, que os EUA avaliam sanções contra Alexandre de Moraes. Além disso, a plataforma Rumble e a empresa Trump Media estão processando o ministro na justiça americana. Nada melhor, portanto, do que parecer afável e equilibrado enquanto câmeras internacionais acompanham cada gesto seu. O “Alexandre-paz-e-amor” também tem passaporte diplomático.


Conclusão:

O novo “meme supremo” do Judiciário brasileiro, que agora sorri e até faz piadas, pode até ter arrancado algumas risadas — mas não nos enganemos. O teatro da cordialidade não elimina os questionamentos de fundo sobre condutas passadas, ameaças a testemunhas ou o protagonismo exacerbado de um magistrado que parece, por vezes, confundir toga com cetro.

No fim das contas, a pergunta que fica é: estamos diante de uma genuína evolução institucional ou de uma simples rebranding de imagem sob holofotes e risco de sanção internacional? Seja qual for a resposta, uma coisa é certa: no Brasil, até as audiências judiciais viram reality show.

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